Acredite nos que buscam a verdade... Duvide dos que encontraram! (A.Gide)

26 dezembro 2008

MINHA CONVERSA NATALINA [catabólica e anabólica] COM O MONGE JOSEFUS


Este ano meu tradicional desconforto com o Natal parecia estar com um sabor diferente. Não conseguindo decifrar, resolvi visitar o monge Josefus em seu casebre à beira-brejo.

Comecei tateando: como expor o que ainda não se sabe o que é? Mas mal pronunciei "desconforto com Natal", Josefus atalhou:

- Você então é mais um dos que reclamam que o Natal virou só comércio e comilança, e perdeu a essência espiritual?...

Percebi um quê de ironia que me incomodou um pouco.

- Bom, eu costumava dizer isso, mas agora parece que surgiu algum outro desconforto... De qualquer modo isso não está errado, né - ou o senhor acha que está, monge Josefus?

- Ou sou monge ou sou "senhor", não dá pra ser os dois ao mesmo tempo...

- Tá bom, desculpe. Mas enfim, o que foi que o senh... que você quis insinuar?

- Que não vejo sentido em o cristianismo reclamar de lhe usurparem uma festa que nunca foi dele. Que ele mesmo tentou usurpar.

- Usurpar soa pesado, não acha?

- Não reconhecer o peso das coisas pesadas nunca levou a nada de bom. A palavra não deveria ser usada pra desconversa, pra falsear. É usada quase exclusivamente pra isso mas não deveria... Enfim, você tem noções razoáveis de história e de antropologia, não?

- É, um pouco...

- Mas com certeza sabe que as festas de mudança de estação já existiam milhares de anos antes do cristianismo, talvez dezenas de milhares. Pausas pra tomar fôlego entre as atividades diferentes que as diferentes estações exigiam. Comemorar desfrutando do que se conseguiu produzir com tanto esforço, dar uns dias de férias ao esforço e à seriedade - até mesmo para a capacidade de esforço e seriedade se refazerem, pois já se sabia que novos trancos sempre vêm: mesmo quando a humanidade não tinha inventado necessidades artificiais, a natureza se encarregava de nunca nos deixar na pura moleza...

... E então: se os cristãos queriam comemorar o nascimento do seu inspirador, por que não criaram uma festa nova pra isso? Se é verdade que Jesus trouxe algo novo na história da humanidade, por que comemorar com o que havia de mais velho?

- Ora, monge Josefus, você sabe muito bem que os cristãos cultivam essa idéia estranha: que se um caminho leva até o alto do morro, todos os outros só podem levar a abismos e devem ser destruídos. Como se os morros tivessem um lado só... E então a intenção era justamente destruir costumes antigos colocando os seus no lugar.

- Tem razão, mas digo mais: dois séculos haviam deixado claro que costumes antigos não se deixam suprimir tão facilmente. Então passaram à tática de não tentar suprimir e sim invadir costumes alheios e lhes atribuir significados novos - como se faz ainda hoje quando as igrejas se apossam de estilos musicais criados fora dela, expressões legítimas de outros anseios e experiências dos jovens e do povo em geral, e lhes atocham palavras religiosas que não têm nada a ver com o que a música expressa... Às vezes até fica bonito, mas no fundo é uma tapeação, um engodo...

- Mas monge, você sabe que com isso os cristãos pretendem introduzir luz onde há escuridão, onde as pessoas estão perdidas...

- Pretendem. Mas deviam começar a abrir os olhos para a realidade da história. Onde os cristãos tomaram conta, geralmente o estado de coisas retrocedeu; conquistas luminosas do pensamento, realizadas com atitude humanista, foram abandonadas e substituídas por modos de vida supersticiosos e opressivos... Estude um pouco da história concreta, documentada, e veja: quem representou luz, quem representou trevas a maior parte do tempo?

- Mas, peraí... como é que o senhor, um monge, vem me dizer essas coisas? Parece que não quer deixar pedra sobre pedra do edifício cristão... Desse jeito era melhor eu ter pego direto um livro de Nietzsche...

- Teria sido, se a sífilis não tivesse botado os miolos do coitado do Nietzsche crescentemente em curto, fazendo ele introduzir uma porção de bobeiras novas lá onde deveria ter deixado um chão realmente limpo, na sua sagrada missão de demolição.

- Mas, monge Josefus!...

- Pois é preciso mesmo não deixar pedra sobre pedra, se ainda for para a semente plantada por Jesus germinar e crescer. Em cima dela era pra ter crescido uma planta viva, não um edifício.

- !!!

II

- No fundo está tudo lá no começo do Evangelho de João: o que está no princípio de tudo é lógos: tem a forma de uma fala, um discurso... Costumam traduzir por "Verbo" ou por "Palavra", mas isso ainda é metáfora, metonímia de parte-pelo-todo: "palavra" como unidade seria léxis, não lógos.

... Lógos é o teor de informação que existe em cada coisa fazendo-a ser o que é, e não um pedaço de substância informe. De certa forma o programa de cada coisa, programa que é lógico: teria cabimento um lógos que não fosse lógico?

... Mas a palavra pro-grama não é muito boa porque significa "escrito antes", sugere uma coisa pré-fixada, rígida, e o lógos é como o programa em feitura e desenvolvimento nas mãos do programador; ou melhor: na mente do programador, a qual se torna una com o programa enquanto o pensa e desenvolve: ela é o programa ("o Verbo estava com Deus, e Deus era o Verbo" - é essa a ordem das palavras no original).

... E se por um lado não há separação entre Deus e sua Fala, por outro essa Fala tampouco está antes ou fora, e sim durante e dentro das coisas que "surgiram por meio dela" - ou pelo menos não fora ou antes das coisas: quem somos nós para declará-la limitada?

... Ou talvez mais precisamente esteja dentro-e-durante de tudo o que está vivo, em processo: "o lógos era a vida". Para quem consegue ler com a mente limpa de doutrinações anteriores, é evidente que o autor não está falando de outra vida, mas da vida - que, aliás, comparece no texto vestida em sua linda palavra "zoé".
E essa vida ainda por cima é "a luz" - e "a luz que ilumina todo homem que vem ao mundo".

- Mas não é "a luz que vem ao mundo e ilumina todo homem"?

- Não, meu caro, no texto grego "que vem ao mundo" se refere a "todo homem", e não a "luz"...

- Eita!...

- Repare que pelo menos até aqui não existe nem um conflito com a descrição do mundo das ciências atuais: a vida que existe e atua nos nossos corpos é luz, energia que chegou à Terra em forma de luz, literalmente. Mas não só a atividade é energia: a substância básica de tudo também é energia, a qual assume sua multiplicidade de formas mediante a informação que a configura (com uso de ainda mais energia).

... Onde termina a informação, onde começa o corpo da luz? Como separar? Não são uma coisa só, mas também não são duas separadas... Uma está com a outra ou é a outra? Não há como determinar um limite interno e... Quem diria! Então a estranheza que o primeiro versículo de João sempre causou não é diferente da estranheza que o pensamento quântico nos causa!...

- Você está querendo dizer "a ciência já decifrou toda a charada"?

- De jeito nenhum! O nível quântico continua enigmático... e além disso aí entram coisas que não são só questão de ciência: eu havia deixado de fora uma palavra da fala de João sobre a luz: "a luz não-enganosa que ilumina todo homem que vem ao mundo". Geralmente se traduz como "verdadeira", mas é interessante que para os gregos só é possível nomear verdade negativamente: é a "ausência de mentira", o "não-enganoso".

... Quer dizer: entra com essa palavra um elemento de julgamento: não é tudo igual; se existe o verdadeiro e não-enganoso, então também pode existir o enganoso. E também está dito: quando a luz "veio para que lhe era próprio", para o mundo "que havia vindo a ser através dela", esse mundo "não a reconheceu" e "o que lhe era próprio não a acolheu ... mas aos que acolheram lhes deu potência de virem a ser filhos de Deus". Entramos em um mundo de cognição (não reconheceu) e de escolha (acolheu x não acolheu), e portanto de liberdade... questões não só de ciência mas de consciência.

... Talvez possa até dizer que aqui começa a fé, nessa história toda. Até aqui tínhamos uma descrição científica; fatos físicos, químicos, biológicos. Mas aqui estamos apostando que essa mesma luz que é vida e atividade mental-neuronal em nós, que essa mesma luz seja capaz de processar uma coisa chamada "sentido", não só reconhecendo sentidos como também criando e atribuindo, e não só criando e atribuindo mas também reconhecendo.

... E mais: apostando que, uma vez tendo virado as formas individualizadas que nós somos, a luz-que-somos-nós seja capaz de escolher - e isso até a escolha-limite que é a entre aceitarmos essa condição de seres capazes de efetiva escolha consciente ("potência de tornar-se filho", ou seja: de ter em si a mesma natureza do pai-do-escolher, da matriz universal da voluntariedade) ou nos deixarmos de fora desse grau superior de responsabilidade.

- Pára, pára!... Quer que eu fique louco com tudo isso de uma vez?

- Tudo isso? Mas foram só dois passinhos pequenos... E o mais importante deles ainda está por vir.

- Será que eu dou conta?

- Claro; já atravessamos o campo e estamos na boca da área...

- !

- Mas antes de partir pra finalização eu preciso ressalvar uma coisa, sobre o que eu estava dizendo: não pense que estou entrando pelas concepções usuais de pecado-e-redenção. A coisa me parece muito mais simples: temos luz-entendimento suficiente para, querendo, reconhecer como são as coisas, "sem engano" (ou pelo menos para ir fazendo nosso caminho gradual na direção disso), mas podemos ignorar, não acolher a luz que temos em potência. Escolher a inconsciência, ou a consciência enganosa. Não consigo imaginar Deus querendo nos fritar por isso. Mas por outro lado é grande a chance de que a consciência enganosa que escolhemos nos leve a tentar passar em portas apenas pintadas na parede.

- Entendo...

III

- E agora o principal: "e o lógos se fez carne e acampou em nós".

- Acampou em nós?? Que papo é esse? Não é "e habitou entre nós"?

- Uma das tiradas mais brilhantes da Bíblia inteira é jogada fora com esse pobre verbo "habitar". Está escrito que o lógos se estabeleceu com a sua tenda - e você sabe o que isso significa dentro do contexto cultural judaico, não? Aliás, é só nessa fala que a herança judaica entra em cena, até aqui estávamos na mais grega das discussões... Enfim, a tenda...

- Sei, a vida dos judeus como um povo organizado, com sua própria lei, começou no tempo em que viveram em tendas, no melhor estilo acampamento dos sem-terra, saindo do Egito e ocupando pouco a pouco a terra de Canaã...

- Sim, mas no meio das outras havia uma tenda especial: a que abrigaria o próprio Deus de Israel, em duas formas...

- ?

- Em forma de pura força, com o suporte físico da Arca da Aliança, e na forma do discurso, da fala dessa força, traduzido em palavras humanas por Moisés e registrado por escrito em tábuas de pedra: A Lei. Por uns 200 anos esse conjunto Arca-Tábuas viveu numa tenda, e com ele a consciência do povo de Israel - tanto consciência de ser um povo como consciência no sentido de código do que seja certo e errado.

... E agora esse João se atreve a dizer: "e a Fala Divina se fez carne", não mais pedra, "e fez sua tenda em nós".

- Não é "entre nós", "no meio de nós"?

- A palavra grega permite as duas leituras, "em" e "entre", e desconfio que as duas leituras estão certas ao mesmo tempo - tanto quanto somos ao mesmo tempo seres individuais e sociais.

... Enfim: apesar de João dizer "a vida era a luz dos seres humanos" (talvez não por acaso com o verbo no passado), parece que há muito se havia estabelecido um dualismo, uma certa oposição, entre palavra-luz e carne-vida - e com isso um divórcio entre pensamento e ação.

... E antes que você me diga que isso é apenas a forma grega de ver o mundo, vou lhe dizer onde essa dualidade aparece de forma particularmente intensa e comovente: na concepção de ser humano dos guaranis.

... Na concepção guarani a alma-fala que habita em nós é responsável não só pela fala como também pela nossa posição vertical e pelo nosso comportamento ético-social - mas além dela também nos habita uma alma-animal. O rompimento de certos preceitos leva a alma-palavra a se afastar e nos deixa vivos porém animalizados: perdendo o eixo vertical, grunhindo ou urrando, incapazes de participar da comunidade humana. Um desses preceitos é o de jamais comer o caça no mato, e sim levá-la sempre para a partilha, a comunhão. Se traio a comunidade humana, sua virtude me abandona: é ilusão que alguém possa viver só para si e permanecer humano, pois ninguém é humano só por si.

- Que fantástico... Tem até Vygotsky e Luria aí no meio...

- Você desculpe que hoje não dá tempo de a gente escarafunchar em detalhe as mil possíveis relações... Agora só quero focar em que João me parece falar de um projeto de radical transgressão dessa dualidade: fala das intenções da Palavra-Consciência de ocupar em nós o potencial que existe para isso nos próprios processos biológicos; ultrapassar o estado "mente sem corpo comanda processo biológico cego", mirando para um ideal em que a corporalidade inteira participe dos processos da consciência, e que com isso também a consciência seja mais e mais una com a capacidade de agir.

... E por isso se faz carne - carne mesmo, músculo... - pois não existe ação nossa que atinja o mundo se não com a participação de músculos, mesmo que sejam os dos braços quando digito este texto, a língua (que é músculo) quando falo, os dos olhos quando demonstramos interesse por alguém.

... O que temos é, enfim, um ideal de integridade - mas, além de integridade, também de autonomia: é em cada um de nós que o Discurso-Responsável-pelo­-Mundo quer estabelecer sua tenda irradiadora de consciência; é na carne-ação de cada um de nós que ele quer se tornar.

- E você com isso dispensou Jesus Cristo?

- De jeito nenhum. Só que eu tenho certeza de que hoje, depois de tanta coisa terrível que foi feita em associação com esses dois nomes humanos que você acaba de pronunciar, esse Jesus - ou a Palavra que atuou na forma dele - não faz questão nenhuma de ser mencionada por esses nomes. Essa Palavra prefere ser pronunciada na forma de ações.

- Mas, escuta aqui, você acha que Jesus era mesmo "encarnação da Palavra"? Isso não é uma crença que ainda por cima desfaz dos seguidores de outras religiões?

- Mas se eu estou dizendo que todo ser humano pode ser, por que Jesus não poderia?

- !

- Hahahaha, essa virada do laço pelo avesso você não esperava, né?

... Mas entendo que, por causa dos horrores que eu já mencionei, seja justificada uma resistência ao nome histórico dele, justamente por parte das pessoas mais consciente e mais morais. Por isso falei de chegar a uma compreensão que vincula diretamente a Palavra-Consciência e a Ação, sem passar pelas palavras-nomes.

... Mas nem por isso precisamos excluir totalmente o personagem histórico das nossas considerações... Segundo o mesmo João, esse Jesus teria dito "aquele que põe fé em mim (e aqui eu entendo: põe fé nisto que eu estou sendo) fará as mesmas coisas que eu, e ainda maiores". Está claro que ele não teve nenhuma pretensão de exclusividade, como quiseram entender depois. E aí acho que em reconhecimento a isso o mínimo que a gente poderia fazer é também não excluir...

- Mas essa compreensão dele é tão rara... Será que você não está completamente sozinho nisso?

- Não sei se isso importa muito... mas, em todo caso, totalmente sozinho eu não estou: dê uma lida por exemplo em O Grande Inquisidor, uma sub-história inserida dentro do romance Os Irmãos Karamázov: minha impressão é que Dostoiévski estava enxergando precisamente a mesma coisa, sem tirar nem pôr.

- E o Natal, monge Josefus? O que é que a gente faz dele?

- Olha, eu sou da opinião que você deixe cada um fazer o que quiser... Você sabe que o Lógos não está nem aí para que celebrem sua encarnação numa festa desse tipo; que a verdadeira celebração é realizar de novo essa encarnação o tempo todo - atualizá-la, como dizem os estudiosos de religiões e mitos, só que aqui não apenas simbolicamente como as religiões costumam fazer, e sim em ações de alcance real.

... Eu diria que estamos celebrando desse modo cada vez que conseguimos realizar as seguintes situações ou qualidades:

     Razão que liberta
     Amor qu
e não deixa que a liberdade se torne

          abandono e
falta de conexão
     encarnados em conjunto em Ação real neste mundo.

... Ou, um pouco mais simples

     Razão que liberta,
     Amor que une em liberdade,
     encarnados em Ação real neste mundo.

... Ou ainda:

     Autonomia (cri)ativa,
     que assume responsabilidades pelo mundo
           voluntariamente, por amor
     respeitando a liberdade alheia,
     não no passado, mas em cada um de nós, agora.

... Mas vou lhe dizer uma última coisa: se você também quiser falar disso na época de Natal, por que não? Com certeza pode ser um enriquecimento desse momento...

... desde que você invente um jeito de não fazer o pessoal ter que passar por isso pra chegar na ceia e na farra, senão a humanidade vai pegar justo ódio e repulsa por aquilo que seria a sua evolução. Definitivamente, discurso que se faz chato não pode ser o mesmo de que eu estava falando!!

- Pode deixar, monge Josefus!

- Escuta meu amigo, que tal a gente atacar aquela comidinha ali, abrir um vinhozinho, e você me chamar de Zé?
.
São Paulo 25.12.2008

8 comentários:

  1. Sem comentários... Ainda não passou a ressaca deste Natal

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  2. "ações de alcance real"... Eis o desafio! E vamos a elas!
    Um abraço,
    Rose

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  3. ja, ja,ja... muy bueno, muy bueno, ¿te acuerdas de "LIBERTAD, LIBERTAD, CUÁNTOS CRÍMENES SE COMETIERON EN TU NOMBRE" (Simòn Bolívar)? Pues realmente sería un crimen eliminar el "nacimiento-de-un-niño-en-un-humlde-pesebre" como símbolo de las fiestas que siempre existieron para despedir un año y darle la bienvenida a otro, sobre todo después de que Rosasini compuso la Misa Solemne por darte apenas un ejemplo de "error histórico".

    Besos (¡Hoy Ana Etrella cumple un cuarto de siglo!!)...estoy en un cyber en Los Teques,perdón, no pude leer todo el texto, apenas un 60%)

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  4. Muito séria e justa sua reflexão sobre o "Natal diário de Todos". Agradeço e parabenizo-o pela retomada histórica, consciente, humanizada/mística e atualíssima com que nos brindou neste amoroso Natal.E que em 2009 consigamos fazer valer, a cada dia, um pouco mais do humano em cada um de nós. Um super abraço.

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  5. Ralf, me faltam palvras contundentes para fazer um comentário a altura de seu texto sobre o verdadeiro sentido do Natal! Mas de Joao Batista a Nietzsche...no minimo complexo e ousado...certeiro tbem ! O fato é que em nome do que chamamos religiosidade parecemos minimizar a grandeza do significado das açoes do Verbo (Jesus)...

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  6. Ralf Rickli,
    Não deve ser nada fácil ser Ralpf Rickli: exaustivamente encantador. Terrivelmente brilhante; mas será que você ainda não consegue separar o Cristo Jesus das igrejas cristãs e de tudo o que os homens fizeram e fazem em seu nome?Você não leu ou não compreendeu o Steiner e sua cristologia? É por causa dela que me considero antropósofo isto é, aspirante a uma "sabedoria do homem".E aí, para mim tudo fica simples. Ou sou apenas simplório?
    " O Verbo" do João é a categoria gramatical que expressa ação. É o que faz, o que cria. Portanto, o movimento contínuo. Gera informação eternamente. Nasce e morre ao mesmo tempo. É o potencial energético e é o feito acabado. É.É o ser que existe enquanto está. E está continuamente. Sendo, exercendo a sua essência. Que é o "esse", que é o ser.
    Talvez a poesia seja o caminho da solução no sentido alemão de condensação (Gedicht). Seria o caminho da perfeição de Gothe (onde não se pode tirar mais nada). Vai ai, anexo um esboço canhestro de principiante sobre o tema: "Sonho de uma Noite de Natal".
    Feliz Natal para você no sentido do poema.
    Wilhelm Kenzler

    Sonho de uma noite de Natal


    De dia

    Correndo, apressado - lá vai você - preocupado.
    Semblante carregado - só problemas - coração apertado.
    Até que, sem saber bem porque existe,
    Resignado, triste, da busca sem fim, desiste.

    Respira fundo, solta a sofreguidão,
    Vazio o coração, se entrega a escuridão.
    “Seja o que Deus quiser” - murmura silenciosa prece,
    Você descansa, não sabe se morre.....ou adormece....

    De noite

    No sono profundo, nos braços de Morpheus
    Você encontra alguém.... é o Criador.... é Deus....
    Você sonha que de’Ele ganha lindo presente
    Jóia querida, valiosa, esquecida.... perdida

    Como criança daquele antigo Natal - lindo
    Você.... sua vida - tudo que você tem e é - vai abrindo
    Vai aos poucos - Você mesmo, seu Eu- descobrindo
    Você que renasceu na manjedoura de seu coração,
    Iluminado pela estrela guia de sua missão.

    Na manhã seguinte

    Ao acordar inteiro, refeito, satisfeito
    Aberta, livre a morada de seu peito,
    Você entende que esquecera - em meio a correria
    Ofuscado pelas luzes fugazes da mundana loteria
    Você esquecera - esquecera que Você existia
    Você que é - ELE - que em você nasceu
    Naquela noite de Natal - o mais belo dia

    Agora você sabe: Natal é já e sempre todo seu
    hoje, aqui, agora, sempre que em você nasce o seu EU.





    Wilhelm Kenzler
    Rua São Benedito 1661
    04735-004 – São Paulo
    Tel. 5687-0368
    wkenzler@ig.com.br

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  7. MUITO obrigado pela sua contribuição, Willy.

    Só me permita observar: claro que li a cristologia de Steiner. Mas quem diz que é impossível lê-la e mesmo entendê-la sem discordar?

    No meu caso nem é propriamente que discorde... É mais o seguinte: creio que cada uma conquista de um centímetro que cada um de nós realiza por si conta mais para a evolução da humanidade que o mero assinar embaixo da conquista de um quilômetro realizada por outro (ou mesmo da tentativa de recriação interior do que o outro disse - que com excessiva freqüência nos leva a assistir a meras encenações do roteiro do outro por esse mestre da mise-en-scène que é o inconsciente, pensando que estamos vendo o que ele viu...)

    Aqui você tem aquilo a que eu cheguei diretamente, não mediadamente. A perspectiva a que meu destino me levou. Não sinto que é para mim a tarefa de reforçar as visões a que Steiner chegou, mas somente de enunciar a minha ao lado das dele. Se há relação ou não, deixo aos interessados o divertimento.

    Pessoalmente não relaciono o LÓGOS ao mundo da ação; suspeito aí de uma pista falsa por São Jerônimo ou sei lá quem ter optado pelo vocábulo latino "verbum" para traduzi-lo. Há uma longa reflexão de Heiddeger sobre a palavra lógos em Heráclito que me impressionou muito. Li apenas em tradução brasileira, no volume Heráclito da série Os Pensadores, mas me impressionou. Porque à primeira vista parece uma baboseira enorme, depois percebe-se que só faz sentido entrando num estado meditativo de mente quase paralisada... Tudo a ver com a Erzeugung künstlicher Langeweile que Steiner coloca como condição para o acesso ao espiritual na nona palestra do GA 350, cuja tradução pelo Gerard Bannwart estou terminando de rever HOJE. Recomendo calorosamente os dois textos - ou melhor, para ser coerente com eles, geladissimamente, rsrss

    Tem mais um texto que gostaria de compartilhar com você neste contexto, mas devo aguardar o encerramento total dos processos do curso Pedagogia da Arte da Paz antes de compartilhá-lo, pois faz parte da minha monografia para esse curso. Assim que eu tiver uma versão mais pública, compartilho com você;

    Enfim, apesar de divergir em algumas coisas, reafirmo minha alegria por receber sua visita, sua leitura e suas contribuições! Grande abraço e um excelente 2010!

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  8. Complementando a resposta a Wilhelm Kenzler algumas horas mais tarde:

    (1) Meu maior problema com a cristologia de Steiner não é que ela deixe simples. Ao contrário: acho que deixa complicadíssimo, sobrecarrega trazendo à baila aspectos que no meu ver são absolutamente desnecessários frente às necessidades da nossa época.

    (2) A questão do Verbo como ação, ou como energia... A Física hoje reconhece a existência de duas entidades irredutíveis entre si: energia e informação. Não haveria mais nada senão os dois (matéria também não passa são estruturas de energia informada).

    Tentei por muitos anos reduzir o Espírito a algum deles, sem sucesso. Até que tive que admitir que há algo além dos dois. E olhando fenomenologicamente encontrei duas coisas que não se reduzem a energia e/ou informação: Intencionalidade e Consciência. E comecei a desenvolver a hipótese: se há algo que mereça ser chamado de espírito, é uma "coisa" una que se manifesta quer como Intencionalidade quer como Consciência, que seriam duas faces de uma coisa só.

    O Espírito portanto não seria ação, e sim o agente. O agente cuja ação é informar a energia.

    Pretendia desenvolver isso em 3 páginas, em 2006-07. Interrompi com onze prontas, entrando em esgotamento pelo grau de instrospecção requerido... Ainda hei de terminar, e provavelmente vai ficar na ordem de 20 páginas. O trecho mais ou menos terminado está disponível em http://www.tropis.org/biblioteca/onto-fragmentos.doc . Se quiser ver algo realmente denso que escrevi, vá lá - rsrs. Entre outras coisas, acaba contendo elementos para uma teoria da natureza da psique...

    Mas é claro que não estou impondo - só expondo!

    Por último: você naturalmente não acharia justificável que se pedisse a um pintor com impulso de pesquisar novos caminhos: "por que é como você não pinta como Fulano, que já tinha levado a pintura a um patamar fantástico antes de você?"... :-D

    Grande abraço!

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