Acredite nos que buscam a verdade... Duvide dos que encontraram! (A.Gide)

07 setembro 2010

sobre a nova montagem de Orfeu da Conceição de Vinicius de Moraes


Bom, como diz a matéria transcrita abaixo, a dramaturgia do Vinicius de Moraes não deixa de deixar a desejar... rsrs (como, aliás, a maior parte das peças, musicais etc., criados por gente da MPB).

Ainda assim, é um marco, por várias razões.  Entre outras, porque rendeu o também esquisito mas ainda assim fascinante filme do Marcel Camus (Orfeu Negro, de 1959) que foi Oscar de melhor filme estrangeiro -

... e mais tarde o do Cacá Diegues que é uma espécie de exploração de como o primeiro poderia ficar 40 anos depois (1999) - e além do mais contado com um olhar mais de dentro. Muitos fizeram pouco do Orfeu do Cacá Diegues, eu não: respeitei profundamente esse filme. Contém uma daquelas cenas que não consigo narrar ao vivo porque a comoção o embarga: quando, diante da tragédia, o pai de Orfeu, encarnado pelo Milton Gonçalves, supera sua degradação ao papel de pastor pentecostal e retoma sua identidade identidade cultural.

Além disso, o filme do Marcel Camus talvez tenha sido o maior dos veículos da música brasileira em ascenção na época, a Bossa Nova, na sua efetiva conquista do mundo. Podemos saber que não é a mais importante das manifestações culturais brasileiras, mas permance até hoje a que teve maior impacto mundial.

E não por último, a peça, mais uma vez via filme, parece ser pelo menos em parte responsável por, bem ou mal, haver um afrodescendente na presidência dos EUA agora: o Obama relata que quando ele tinha uns 10 anos sua mãe o levou pra ver um filme que ela adorava desde antes de conhecer o pai dele, e chorou o tempo todo no filme: o Orfeu Negro, rsrs.

Também os afro-sambas de Vinicius e Baden estão numa fase de revalorização (vocês vão ler bastante mais sobre isso aqui em 2011). Quem sabe esteja na hora de o Brasil lembrar do lado Vinicius de Moraes da sua alma, pra não se endurecer demais nesta nova fase de modernização...

Abraços gerais,
Ralf




07/09/2010 - 09h48
"Orfeu" é atualizado em montagem de Aderbal Freire-Filho
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/794945-orfeu-e-atualizado-em-montagem-de-aderbal-freire-filho.shtml


MARCELO BORTOLOTI, DO RIO

Pela primeira vez a peça "Orfeu da Conceição" será exibida no circuito comercial em seis capitais do país.

A nova montagem, que estreia nesta quinta no Rio, custou R$ 2,2 milhões (sendo R$ 1,6 milhão captado via Lei Rouanet), foi idealizada por Gil Lopes e tem direção de Aderbal Freire-Filho.

Pouca gente viu encenado o texto original de Vinicius de Moraes, que transporta para os morros cariocas o mito grego de Orfeu, e esta novidade poderia bastar para atrair o público. Ou não.

Freire-Filho optou por uma versão mais palatável. Inventou um personagem-poeta, referência ao próprio Vinicius, uma espécie de narrador que atravessa o espetáculo ao lado de cinco amigos, ajudando a explicar passagens truncadas e suavizando as mudanças de cena.

"Orfeu" tem reconhecida importância histórica. A peça marcou o início da parceria entre Vinicius e Tom Jobim e ajudou a romper a hegemonia branca nos palcos brasileiros dos anos 1950, ao escalar apenas atores negros.

Além disso, já trazia os traços e curvas que mais tarde notabilizariam o arquiteto Oscar Niemeyer, responsável pelo cenário. Como texto dramático, no entanto, suas qualidades são discutíveis.

Faltam conflitos além da trama central. As passagens entre os atos são bruscas e, por vezes, o destino de determinado personagem carece de melhor explicação.

Freire-Filho não fala a respeito disso com facilidade: "A peça é incrível. Minha interferência foi apenas para transportá-la para os dias de hoje e dar uma maior comunicabilidade", afirma.

Aos poucos, e tão cheio de dedos quanto possível para tratar de algo praticamente sagrado no meio artístico, o diretor vai se abrindo. "Vinicius escreveu um ato na década de 1940 e outro, dez anos depois, o que pode ter contribuído para essas passagens bruscas", disse.

MUDANÇAS NECESSÁRIAS

As mudanças promovidas no texto não foram cosméticas. Era impossível fugir de uma referência às favelas de hoje, e o diretor incluiu três bandidos que assaltam o personagem-poeta, além de um funk em meio à trilha sonora.

Mas o tráfico não aparece e até os ladrões acabam convertidos em personagens da trama original. Ao lado dos diretores musicais Jaques Morelenbaum e Jaime Alem, ele escolheu uma série de canções feitas posteriormente por Tom e Vinicius.

De fato, as músicas compostas para a peça, numa época em que Tom Jobim não passava de um obscuro pianista da noite carioca, não são o que a parceria produziu de melhor, ainda que incluam boas canções como "Se Todos Fossem Iguais a Você".

No novo espetáculo, aparecem outras obras-primas da dupla: "Este Seu Olhar", "A Felicidade" e "Chega de Saudade".

Em cena estarão 16 atores negros ou mulatos, todos na faixa dos 30 anos e sem grande carreira pregressa.

Orfeu é interpretado por Érico Brás, que participou do filme "Quincas Berro D'água". É uma aposta. Também será negro o personagem que simboliza Vinicius de Moraes. Uma caracterização justa para o poeta-diplomata que se dizia o "branco mais preto do Brasil".

ORFEU
AUTOR Vinicius de Moraes
DIREÇÃO Aderbal Freire-Filho
QUANDO estreia 9/9 no Rio de Janeiro e 23/9 em São Paulo
ONDE Canecão e HSBC Brasil (SP)
CLASSIFICAÇÃO 14 anos

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