Depois dessa primeira aprovação do Projeto Ficha Limpa, recebi a seguinte mensagem de uma amiga que esteve empenhada em colher assinaturas:
X: "Grandes movimentos são construídos em momentos chave. A vitória da Ficha Limpa foi um momento especial onde começamos a mudar a situação da corrupção no nosso país, e acabamos gerando o maior movimento online da nossa história.
Aqui estamos – somos quase 600.000 brasileiros politicamente engajados recebendo esta mensagem. Dos milhares de emails escritos para a Avaaz na última semana, a mesma pergunta surgiu várias vezes: qual é o próximo passo?
Este é um movimento cidadão, portanto vamos decidir juntos. Clique abaixo e responda um questionário para sugerir idéias de como podemos mudar o Brasil e o mundo [ . . . ]"
Como eu também havia caído nessa, respondi a ela - com minha inacreditável e já famosa cara dura (transcrevo agora três mensagens direto):
Ralf: "Desculpe, mas você quer dizer 600.000 brasileiros politicamente enganados por um projeto que não é o que se disse - e espero de coração que você seja apenas mais um de nós enganados, e não dos enganantes."X: "Ralf, bom dia! Não sou nem uma das duas opções, sou outras coisas e também acredito que este movimento civil foi lindo e de uma proporção assustadora. As pessoas se mobilizaram, reenviaram aos seus pares e é o que é. / Importante celebrar as etapas e poder arriscar, sempre! / As mudanças acontecem com o tempo, mais estar conscientizado de que existe um movimento forte e reverberador me deixa mais tranquila. / Na paz, X"Ralf: "Sim, X, eu fico muito feliz quando vejo que o povo brasileiro também é capaz de se mobilizar!Mas será que "se mobilizar" é tudo o que importa, não faz diferença o "em favor do quê"? Se esse "o quê" é o que diz ser, ou se é (mais um) engodo?A população brasileira já se mobilizou muitas vezes em apoio a quem prometia instaurar a moralidade na política; nenhuma vez a promessa era autêntica: Collor, Jânio Quadros, os militares em 1964 (que contaram com apoio maciço). E também Hitler se firmou pela mobilização maciça da população em torno de coisas tão desejáveis, que as pessoas abriram mão de questionar o "como". Aliás, ele também prometia precisamente limpeza.Eu mesmo assinei a petição pelo Ficha Limpa e passei adiante, bem antes de receber de você. Também sinto que a causa em si é justa, e o entusiasmo por ela me levou a assinar sem conhecer o projeto em detalhes.Depois vários amigos mais informados e/ou cuidadosos me apontaram que o projeto não "tem falhas": ele realmente é uma ferramenta com mais potencial para o mal que para o bem: basta um político sujo com amizade suficiente com um delegado ou um promotor protocolar uma denúncia falsa qualquer e... pronto: já tirou o seu concorrente do caminho. O julgamento da questão pode levar anos, ou talvez a justiça rejeite a denúncia, mas aí a eleição passou... E pior: é evidente que quem escreveu o projeto como escreveu sabe que ele serve para isso.Não vou detalhar a análise, muito vêm fazendo isso bem melhor do que eu posso - e definitivamente não são pessoas com interesse na "preservação da roubalheira" ou coisa parecida.Por isso não posso concordar com você que "mobilizar-(se) é o que importa", e não importa muito pelo quê. Consciência bem-informada e penetrante vem antes. Não quero correr o risco de estar com as senhoras da "Marcha da Família com Deus em defesa da Pátria" de 1964. E espero que você também não! / Abraços & bom domingo"
Taí. Costumo dizer: "fora da consciência-nas-ações não existe salvação". Mas tô longe de ser perfeito e volta e meia largo ações sem consciência suficiente. Nem li o texto todo da petição que me enviaram, o olho bateu numas palavras-gancho que me fizeram pensar no "deputado do castelo" e outros semelhantes, e passei adiante.
Agora, mesmo não conseguindo desfazer o já feito, gostaria que as pessoas a quem reenviei a petição do Ficha Limpa soubessem o quanto me entristece ter ajudado a nos fazerem de bobos.
Ralf Rickli
23.05.2010
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