AS VIDAS POR TRÁS DE UM ACARAJÉ
Dia 31 fui participar de um ato público no centro de Guarapari, e quis aproveitar pra conhecer mais dos seus arredores, começando por Setiba.
Logo ao entrar, reparei num pequeno grupo de mulheres com camisetas iguais, que levavam caixas com alguma coisa pra vender.
Pouco depois paramos na beira da praia para aquele de-sempre que nunca é demais: subir nas pedras, reconhecer a paisagem, comentar a temperatura e a cor da água... Perambulamos por ali até que, numa curva, topamos com... a Lea. Uma daquelas mulheres.
A Lea nos ofereceu salgados: empadas, quibes, e acarajé. “Acarajé baiano”, avisou: “nós somos da Bahia, vendemos o acarajé ao estilo de lá”. Comentei qualquer coisa sobre as diferenças entre a comida baiana e a capixaba, e ela perguntou: “vocês são todos daqui, capixabas?” Expliquei que o Edimar e o Willian sim, mas que eu sou do Paraná. “Só que vivi muitos anos em São Paulo, antes de vir pra cá”.
“Também já morei em São Paulo”, me diz, levando a conversa naturalmente para o “onde”. “No Morumbi. Eu era pequena, morava na casa dos patrões com a minha mãe que trabalhava de doméstica. Também ficamos um tempo na Barra Funda, e eu estudei na escola tal na Liberdade. Depois voltamos para o interior da Bahia, e acabamos vindo para cá. Gosto muito daqui.”
“Você é a Gracinha?”, pergunto olhando a camiseta que diz “Acarajé da Gracinha” - ou algo parecido. Ela riu: “Todo mundo pergunta isso. Gracinha é a minha mãe, eu sou Lea”.
Em seguida Lea me conta que, morando aqui no Espírito Santo, se graduou em Pedagogia - “prazer, então somos colegas!”. Que deu aulas como temporária na rede municipal, mas este ano, com a mudança de gestão, não foi chamada. Diz que sente falta da sala de aula (conheço bem isso!), mas não está mal porque está estagiando no Fórum, já que conseguiu uma bolsa e está no segundo período de Direito.
Penso na dona Gracinha, que não conheci, lutando com as panelas e a faxina numa mansão ou apartamento de luxo no Morumbi, com a filha a tiracolo. Levando a filha para Salvador a tratamento de saúde. Inventando sua produção de salgados e acarajés numa cidade praiana do Espírito Santo. A filha, em seu segundo curso superior, esbaldando simpatia na venda dos salgados da mãe na praia, no feriado.
Esse povo da Bahia é folgado mesmo, não tem jeito, né?
Cuidado: eu, paranaense mas antes de tudo brasileiro, jogo praga pesada em quem não perceber de cara que é ironia.
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