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Publicado originalmente em 14/02/2014 na coluna Espaço LGBT do jornal ES Hoje.
Não costumo chamar atenção para produtos da TV Globo, mas, como em tudo na vida, há momentos que merecem uma exceção. Por outro lado, para a vida efêmera dos assuntos televisivos, este já é um assunto velho - embora fosse o mais palpitante do momento há apenas três semanas. O fato, porém, é que os temas abordados no final da novela Amor à Vida são de importância perene - e tanto, que comentá-los suficientemente exigiria pelo menos três vezes os 3000 caracteres de que disponho no jornal ES. Na impossibilidade de ampliar este texto agora, apenas reproduzo o texto como saiu no jornal - mas não deixo de registrar a intenção de desenvolvê-lo mais em outro momento.
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Publicado originalmente em 14/02/2014 na coluna Espaço LGBT do jornal ES Hoje.
Não costumo chamar atenção para produtos da TV Globo, mas, como em tudo na vida, há momentos que merecem uma exceção. Por outro lado, para a vida efêmera dos assuntos televisivos, este já é um assunto velho - embora fosse o mais palpitante do momento há apenas três semanas. O fato, porém, é que os temas abordados no final da novela Amor à Vida são de importância perene - e tanto, que comentá-los suficientemente exigiria pelo menos três vezes os 3000 caracteres de que disponho no jornal ES. Na impossibilidade de ampliar este texto agora, apenas reproduzo o texto como saiu no jornal - mas não deixo de registrar a intenção de desenvolvê-lo mais em outro momento.
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O assunto mais comentado há uns dias foi o primeiro beijo na boca entre
dois homens numa novela da TV brasileira. Aliás, não só comentado como
ruidosamente comemorado, e por uma parcela tão grande do público, que
certamente o número de héteros comemorando ultrapassou o de LGBTs. Isso é
ótimo, pois indica que há uma grande massa de heterossexuais que não desejam que o país retroceda a uma
ditadura da hipocrisia e da ignorância!
Na própria comunidade LGBT, no entanto, a cena do beijo não foi a de maior impacto em Amor à Vida. Para entender, nada melhor
que este depoimento anônimo que se espalhou velozmente na net, veiculado por um
amigo do autor: "Estavam todos na
sala - eu no sofá - quando o Félix beijou o ‘carneirinho’. Silêncio… Fiquei
quieto pra não dar motivos, embora estivesse fazendo a drag por dentro. Mas a cena final, do Félix e do
César, eu não aguentei, veio um choro descontrolado que estava preso esses
4 anos que não falamos direito. Estava em total descontrole… daí veio
minha mãe me abraçar com a cara toda melada de chorar, e meu pai do outro lado
segurou minha mão, e pôs a outra mão em volta do meu ombro. Não falamos nada!
Na hora de dormir, meu irmão entrou no quarto, deu a mão, e quando eu ia apenas
apertar, ele me puxou, deu um abraço e disse que ele sempre vai ser meu irmão.
E chorei de novo. Pela primeira vez [nesses 4 anos] não dormi no inferno."
Convém relembrar o contexto: Félix, que passou a maior parte da história
como vilão, vive agora com Niko numa relação amorosa, não só sexual, constituindo família com este, seus filhos, e ainda
César, o pai de Félix, cuja rejeição homofóbica ao filho foi a principal fonte
das distorções na vida deste, e agora está em cadeira de rodas devido a um AVC.
A cena: Félix dá ao pai os cuidados matinais, e em seguida o leva à praia, onde
assistem ao nascer do sol. Aí, de modo ainda sofrido, Félix afirma seu amor
pelo pai. Este busca com dificuldade a mão de Félix e a segura dizendo “também
te amo - meu filho”. Por um instante o universo parece pacificado… e a novela
termina aí.
Não quero enveredar agora pelas muitas discussões cabíveis; só apontar
que esse final fez de Amor à Vida a
primeira novela brasileira com um personagem principal gay - e mais:
inteiramente estruturada em torno de uma das questões LGBT mais agudas: ninguém
- LGBT ou hétero - quer ter de optar entre a família de origem e o parceiro de
intimidade sexual; todos almejam uma comunidade
de amados integrada, sem exclusões. Mas não muitos LGBTs alcançam.
É claro que é bom que um beijo nosso, que sentimos como lindo, seja
reconhecido como lindo também por outros - mas isso é detalhe. Importa é
podermos ser quem somos e amarmos do jeito que brota espontâneo de dentro de
nós, sem nos vermos excluídos por isso da consideração, carinho e convívio dos
outros que também amamos. Já se sabe
que sentir-se acolhido é a necessidade humana mais elementar; sem isso não há
quem seja capaz de sentir amor à vida.
Nem à sua, nem à dos outros.
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